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- Sequestro Internacional de Crianças e os Desafios na Aplicação da Convenção de Haia
A remoção ou retenção de um menor de 16 anos por um de seus genitores, no âmbito internacional, configura sequestro internacional fundamentado na Convenção de Haia de 1980. O sequestro da criança por um dos genitores pode ocasionar cicatrizes biológicas e sociais que podem durar por vários anos. A Configuração Jurídica do Sequestro Internacional de Crianças Situação de Transferência Ilícita Convenção de Haia e as Exceções para o Retorno Imediato do Menor Sequestro Internacional e Violência Doméstica O impacto Neuropsicológico do Sequestro Internacional na Infância 6. Conclusão 7. Referências A Configuração Jurídica do Sequestro Internacional de Crianças Como resposta a uma das situações mais complexas no âmbito do direito de família, foi criada a Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças em 1980, e incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto n.º 3.413/2000, desejando proteger a criança no plano internacional dos efeitos prejudiciais resultantes de mudança de domicílio ou de retenções ilícitas e estabelecer procedimentos que garantam o retorno imediato da criança ao Estado de sua residência habitual, bem como assegurar a proteção do direito de visita. De acordo com os termos da Convenção de Haia, a conduta praticada por um dos pais se caracteriza de duas formas: a) Retenção ilícita - ocorre quando uma viagem internacional com o menor é autorizada por um determinado período, no entanto, vencido o prazo, o genitor que viajou com o menor não retorna para o país de origem. Exemplo: uma mãe viaja com o seu filho para passar as férias na Itália com a devida autorização do pai, mas ao final no período, se recusa a trazê-lo de volta ao Brasil, onde o filho tem residência habitual com o pai. b) Transferência ilícita - ocorre quando a criança é retirada de seu país de residência habitual e levada para o exterior, em violação a um direito de guarda exercido legalmente por outra pessoa ou instituição. Exemplo: um dos genitores leva o menor para fora do país sem autorização de quem detém a guarda legal. A transferência ilícita pode ser de difícil compreensão para quem vive em países com controle rigoroso de fronteiras, no entanto, não é raro de acontecer. Situação de Transferência Ilícita No Brasil, a legislação é bastante severa quando se trata de uma criança ou adolescente menor de 16 (dezesseis) anos deixar o país. A matéria é tratada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), nos artigos 83 e seguintes, que exige expressa autorização. A exceção ocorre em duas situações: primeiro, se estiver acompanhado de ambos os pais ou responsável; segundo, se estiver na companhia de um dos pais, autorizado expressamente pelo outro através de documento com firma reconhecida. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também trata da matéria, Resolução nº. 131 , de 26/05/2011, incluindo em seu site uma cartilha orientadora para embarque de menores em voos para o exterior e formulário padrão de autorização de viagem internacional. Ocorre que muitos países não possuem uma lei formal de autorização de saída para menores viajando com um dos pais, limitam-se apenas a “recomendações” para que o genitor que viaja com o menor tenha uma carta de consentimento do outro. Países que possuem legislações com fundamento em preceitos religiosos, mesmo que signatários da Convenção de Haia, tendem a conceder ao pai autoridade total sobre os filhos. Como exemplo de subtração de menor levado para país que dificulta o cumprimento judicial, é o caso de Alba Rodríguez, uma mãe espanhola, que teve a sua filha levada pelo pai para o Egito, com promessa de viagem temporária para visitar a família paterna, conforme La Gaceta (2025): La situación ha escalado hasta el horror: Alba ha sido informada por un familiar disidente del entorno paterno de que su hija ha sido prometida en matrimonio a un niño egipcio de 10 años, y que la unión se formalizará cuando ella cumpla nueve años. La pequeña, por ahora, está a punto de cumplir cinco. A pesar de haber denunciado ante todas las instancias posibles —Ministerio de Exteriores, Fiscalía de Menores, embajadas, consulados, ONG—, la madre no ha recibido ninguna ayuda efectiva. Egipto no forma parte del Convenio de La Haya sobre sustracción internacional de menores, lo que complica la vía judicial. «Una jueza me dijo que lo mejor era que fuera yo misma a buscarla, por mi cuenta y riesgo», relata Alba con desesperación. Casos como o enfrentado pela Alba, cidadã espanhola, em que o Direito Internacional não é respeitado por um dos Estados, restam apenas recursos diplomáticos, geralmente lentos e de baixa efetividade, para solicitar o retorno da criança. Convenção de Haia e as Exceções para o Retorno Imediato do Menor O sequestro internacional de crianças, nos termos da Convenção de Haia, é um drama que reúne esforços por parte da comunidade internacional, visando a proteção dos menores, garantindo o retorno ao país de sua residência habitual. Todavia, a Convenção estabelece exceções, como prevê o artigo 13: Sem prejuízo das disposições contidas no Artigo anterior, a autoridade judicial ou administrativa do Estado requerido não é obrigada a ordenar o retorno da criança se a pessoa, instituição ou organismo que se oponha a seu retorno provar: a) que a pessoa, instituição ou organismo que tinha a seu cuidado a pessoa da criança não exercia efetivamente o direito de guarda na época da transferência ou da retenção, ou que havia consentido ou concordado posteriormente com esta transferência ou retenção; ou b) que existe um risco grave de a criança, no seu retorno, ficar sujeita a perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer outro modo, ficar numa situação intolerável. A autoridade judicial ou administrativa também poderá não aceitar o retorno da criança quando decorrido mais de um ano entre a data da transferência ou da retenção ilícita e a data do início do processo, ainda, se for provado que a criança já se encontra integrada no seu novo meio (artigo 12). No mesmo sentido de recusa, “o retorno da criança poderá ser recusado quando não for compatível com os princípios fundamentais do Estado requerido com relação à proteção dos direitos humanos e das liberdades fundamentais” (artigo 20). As exceções são cuidadosamente verificadas pelos tribunais para não haver uma banalização do propósito principal da Convenção de Haia. Sequestro Internacional e Violência Doméstica A violência doméstica é considerada exceção que se enquadra no artigo 13, b, da Convenção de Haia, sendo entendida como: a) risco direto à criança - quando a violência doméstica no país de origem era dirigida também à criança, nesse caso se argumenta que o retorno a exporia a um risco grave de perigo físico ou psíquico. b) risco indireto - quando a violência era contra o genitor cuidador. Nesse caso, ainda que a criança não seja a vítima direta da violência, retornar a um ambiente onde seu genitor cuidador (geralmente a mãe) será vítima de violência, coloca a própria criança em uma situação intolerável, expondo-a em risco grave de perigo psíquico, pois testemunhar a violência contra um dos pais é hoje amplamente reconhecido como uma forma de trauma e abuso infantil. As questões relativas à subtração internacional de menores ganham destaque no Brasil com o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da ADI 4245. O processo foi incluído no calendário de julgamento pelo Presidente da sessão, com data prevista para 13/08/2025. O tema questiona alguns pontos da Convenção de Haia, como determinar o retorno imediato da criança. A parte autora defende que essa regra não deve ser absoluta por contrariar o artigo 5°, inciso XXXV, da Constituição Federal, que assegura o direito de acesso à Justiça, e o artigo 227, que assegura proteção prioritária aos direitos da criança e do adolescente. Portanto, esse tema abrange a violência doméstica. A intenção é priorizar as perícias psicológicas e sociais para aferir o melhor interesse da criança nos processos de busca e apreensão propostos pela União, através da Advocacia-Geral da União (AGU), com fundamento na Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças. O impacto Neuropsicológico do Sequestro Internacional na Infância O sequestro parental é uma forma de trauma complexo, pois o rompimento forçado da criança do convívio de um dos genitores, ainda que motivado por ambiente inseguro, pode provocar desequilíbrios significativos no desenvolvimento neurobiológico da criança. A criança que experiencia um sequestro internacional, mesmo quando a fuga é para protegê-la de um ambiente de violência doméstica, sofre grande consequências emocionais, pois ela sente medo de ter que retornar, há perda de confiança, dificuldades de apego e insegurança pela mudança cultural. Tudo isso pode causar alterações cerebrais associadas à dificuldade em formar novos vínculos e em lidar com desafios. Há um sentimento constante de tristeza e ansiedade, o que eleva os níveis de estresse. Consequentemente, a exposição prolongada ao estresse ativa um sistema chamado eixo: hipotálamo–hipófise–adrenal (HPA), isso resulta em níveis elevados de cortisol, um hormônio que prejudica áreas importantes do cérebro, como o hipocampo, a amígdala e o córtex pré-frontal. Essas áreas são fundamentais para a memória, as emoções e o modo como é regulado o comportamento. Segundo Beelen (2016), “quanto mais jovem a criança, mais amplo e duradouro é o impacto [do trauma], […] e a Experiência Traumática Pervasiva (ETP) afeta o funcionamento geral da criança em praticamente todas as tarefas do desenvolvimento” (pág. 7). Esse estudo é relevante ao se considerar as consequências do rompimento de laços pessoais devido à diferença cultural e a ambivalência emocional que caracteriza a maioria dos casos de sequestro internacional. Assim, percebe-se que a subtração internacional de crianças apresenta uma complexidade neuropsicológica que transcende a análise jurídica tradicional, exigindo uma compreensão profunda dos diferentes contextos que envolvem a retirada da criança de um ambiente familiar seguro. Por outro lado, quando a subtração ocorre como medida de proteção contra violência física ou psicológica exercida por um dos genitores, a criança já se encontra em estado de estresse tóxico crônico, com seu sistema neurológico previamente comprometido pela exposição contínua ao ambiente de insegurança e agressão. Portanto, cada caso de subtração internacional demanda uma análise individualizada que considere não apenas os aspectos legais, mas fundamentalmente o superior interesse da criança. 6. Conclusão O sequestro internacional de crianças representa um dos maiores desafios para os sistemas jurídicos contemporâneos. De um lado, temos a Convenção de Haia de 1980, o mais importante esforço da comunidade internacional para proteger os menores de deslocamentos ou retenções ilícitas, buscando assegurar o retorno imediato à sua residência habitual. Do outro lado, a complexa realidade de casos como o de Alba, que demonstram a impotência da norma, mormente quando um dos Estados envolvidos não é signatário da Convenção. Ainda, as exceções previstas na própria Convenção, como o grave risco à criança ou a sua adaptação ao novo meio, geram debates intensos e decisões judiciais divergentes, entre determinar o retorno imediato ao país de origem e a necessidade de analisar e priorizar o melhor interesse da criança. 7. Referências BEELEN, B. M. J. The Psychological Impact of Child Abduction – Meaningful Participation of Children . Brno: Syntagma, 2016. Disponível em: 08._Beelen_-_The_psychological_Impact_of_Child_Abduction_and_the_Meaningful_Participation_of_Children.pdf Acesso em: 14 jul. 2025. BRASIL. Decreto nº 3.413, de 14 de abril de 2000. Promulga a Convenção sobre os Aspectos Civis do Seqüestro Internacional de Crianças. Disponível em: planalto.gov.br . BRASIL. Ministério da Justiça e Segurança Pública. Subtração Internacional de Crianças. Disponível em: gov.br/mj/pt-br/assuntos/sua-protecao/cooperacao-internacional/subtracao-internacional . BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República,. Disponível em: L8069 Acesso em: 13 jul. 2025. CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL (CJF). Subtração Internacional de Criança. Disponível em: cjf.jus.br . CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Viagem ao exterior. Brasília, DF: CNJ, [20--]. Disponível em: Viagem ao Exterior - Portal CNJ Acesso em: 13 jul. 2025. GACETA. Um marroquino dá vários socos e envia ao hospital duas mulheres nas festas de Molvízar, Granada, por pedirem que ele descesse do palco. La Gaceta, 13 jul. 2025. Disponível em: https://gaceta.es/espana/una-madre-espanola-denuncia-que-su-hija-esta-secuestrada-en-egipto-y-que-va-a-ser-casada-pese-a-tener-tan-solo-cuatro-anos-20250708-1519/ Acesso em: 25 jun. 2025. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). Sequestro internacional de crianças: uma preocupação mundial à luz da jurisprudência do STJ. Publicado em 4 de agosto de 2024.
- Neurociência, Neurodireito e Seguridade Social no Brasil
A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 194, insere capítulo dedicado à Seguridade Social, assegurando os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. No entanto, alcançar esses direitos pode ser doloroso para muitos segurados do Regime Geral de Previdência Social e para pessoas em situação de vulnerabilidade que necessitam da assistência social. Essa situação se deve ao fato de que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), autarquia federal responsável pelo reconhecimento do direito, pela manutenção e pelo pagamento de benefícios, comete erros sucessivos ao avaliar requerimentos de benefícios, transportando o processo administrativo para o judicial. Diante dessa situação, propõe-se uma conexão entre Neurociência, Neurodireito e Seguridade Social com o intuito de incorporar conhecimentos e métodos neurocientíficos capazes de proporcionar aos profissionais da saúde e julgadores novas possibilidades de compreensão e enfrentamento dos desafios. 1. Neurociência e sua Relação com o Direito 1.1. Subdisciplinas da Neurociência e suas Contribuições para o Entendimento do Comportamento Humano 1.2 A Neurociência e a Tomada de Decisão Jurídica 2. Evolução do Neurodireito 3. Neurociência e sua Relação com a Seguridade Social no Brasil 3.1. Princípio da Negação. A Cultura do Indeferimento do Sistema Previdenciário 3.2. A Violência nas Perícias Médicas Previdenciárias e os Impactos Neuropsicológicos 4. Consequências Neurobiológicas da Espera por Decisões Judiciais 5. Considerações Finais 6. Referências 1. Neurociência e sua Relação com o Direito Com base nos ensinamentos de António Damásio, que sempre buscou compreender os mecanismos por trás do cérebro, da mente e do comportamento; nas complexidades do cérebro transmitidas pelo neurologista V. S. Ramachandran em O que o cérebro tem para contar (2014), obra em que ele explora os membros fantasmas, cérebros plásticos e as lesões cerebrais, pode-se concluir que a Neurociência é uma disciplina científica multidisciplinar que investiga o funcionamento do sistema nervoso, com foco no cérebro, especialmente no modo como influenciam nossas emoções, decisões e comportamentos. De acordo com Roberto Lent (2010, p. 6), “o mais correto seria referir-se a Neurociências, no plural”, considerando que esse campo compreende diversas matérias, como a neurociência celular, molecular, comportamental, entre outras, vejamos: A Neurociência comportamental dedica-se a estudar as estruturas neurais que produzem comportamentos e outros fenômenos psicológicos como o sono, os comportamentos sexuais, emocionais, e muitos outros. [...] A Neurociência cognitiva trata das capacidades mentais mais complexas, geralmente típicas do homem, como a linguagem, a autoconsciência, e a Memória etc. (LENT, Roberto. Cem bilhões de neurônios: conceitos fundamentais de neurociência. 2. ed. São Paulo: Atheneu, 2010. p. 6). No que diz respeito ao campo jurídico, a história está repleta de conceitos sobre o Direito como conjunto de normas e como regulação das condutas humanas, mas optou-se por citar o pensador LYRA FILHO, 2010, pela simplicidade e fuga dos conceitos arraigados: “Direito é processo, dentro do processo histórico: não é uma coisa feita, perfeita e acabada; é aquele vir-a-ser que se enriquece nos movimentos de libertação das classes e grupos ascendentes e que definha nas explorações e opressões”. Por consistir nas relações humanas, a evolução jurídica acontece em seu núcleo, refletindo a complexidade e diversidade neurobiológica das pessoas que integram as sociedades. Foi a partir das obras de Thomas Hobbes, O Leviatã (1651), e John Locke, Ensaio sobre o governo civil (1690), que surgiram as primeiras ideias representando uma mudança do pensamento social e jurídico, as quais resultaram na Revolução Francesa de 1789, fundamentada em princípios incontestáveis da igualdade de todos perante a lei. 1.1. Subdisciplinas da Neurociência e suas Contribuições para o Entendimento do Comportamento Humano Como compreendido anteriormente, a Neurociência é um campo interdisciplinar que investiga o sistema nervoso, combinando conhecimentos de diversas outras áreas do conhecimento humano, sendo que cada uma investiga dimensões específicas do sistema nervoso com o intuito de entender a conduta humana, como: a) Neurociência Molecular e Celular: investiga os processos bioquímicos e moleculares que ocorrem nos neurônios e suas ligações sinápticas, oferecendo fundamentos para entender como essas alterações podem influenciar o comportamento, o que é relevante para o mundo jurídico; b) Neurociência Sistêmica: examina as redes neurais e como diferentes regiões cerebrais dialogam para gerar funções complexas, como a percepção e o controle motor; c) Neurociência Cognitiva: estuda os processos mentais superiores, como atenção, memória e tomada de decisão, colaborando para a compreensão de como essas funções são representadas e processadas no cérebro; d) Neurociência Comportamental: responsável pela análise das relações entre o sistema nervoso e o comportamento observável, ou seja, como os fatores neurológicos influenciam ações e reações em diferentes situações. A síntese acima se baseia em diversos conceitos de Neurociência, dos quais merecem destaque, in verbis : Em sua forma mais básica, a neurociência é o estudo do sistema nervoso - da estrutura à função, do desenvolvimento à degeneração, na saúde e na doença. Abrange todo o sistema nervoso, com foco principal no cérebro. Incrivelmente complexo, nossos cérebros definem quem somos e o que fazemos. Eles armazenam nossas memórias e nos permitem aprender com eles. Nossas células cerebrais e seus circuitos criam novos pensamentos, ideias e movimentos e reforçam os antigos. Suas conexões individuais (sinapses) são responsáveis pelos primeiros passos de um bebê e por cada desempenho atlético recorde, com cada pensamento e movimento exigindo tempo e conexões primorosamente precisos. (Tradução nossa, KING'S COLLEGE LONDON, s.d.) Os neurocientistas se concentram no cérebro e seu impacto no comportamento e nas funções cognitivas. A neurociência não se preocupa apenas com o funcionamento normal do sistema nervoso, mas também com o que acontece com o sistema nervoso quando as pessoas têm distúrbios neurológicos, psiquiátricos e do neurodesenvolvimento.(Tradução nossa, GEORGETOWN UNIVERSITY, s.d.). A Neurociência abrange diversas subdisciplinas que investigam o sistema nervoso em diferentes níveis, desde o molecular e celular até o cognitivo e comportamental. Essa amplitude de estudo permite uma compreensão aprofundada da conduta humana, o que se mostra de grande relevância para o campo jurídico. A Sociedade de Neurociência (SfN), uma das maiores organizações dedicadas à pesquisa do cérebro, destaca a crescente interseção entre neurociência e Direito. Questões como responsabilidade, estado mental, capacidade de controle do comportamento, impacto do vício ou da idade na tomada de decisões, e a precisão da memória são exemplos de pontos em que os insights neurocientíficos podem auxiliar o sistema jurídico. Embora a aplicação da neurociência nos tribunais brasileiros ainda seja limitada em comparação com outros países, há um avanço notável, especialmente nas áreas do Direito Penal e Civil, que buscam compreender a vontade por trás de atos criminosos, a tomada de decisão, a culpabilidade e a reabilitação. Assim, ao aprofundar a compreensão dos mecanismos neurais e a conexão entre o cérebro e as manifestações da mente humana, as neurociências contribuem para o aprimoramento da prestação jurisdicional, consolidando o Neurodireito e sua capacidade de analisar os fatores inconscientes e emocionais nas decisões e conflitos. 1.2 A Neurociência e a Tomada de Decisão Jurídica A aproximação entre a Neurociência e o Direito tem sido cada vez maior. Diversas parcerias são formadas para capacitar juízes na tomada de decisões. Como exemplos, podemos citar a Dana Foundation, que constituiu uma parceria com a American Association for the Advancement of Science (AAAS) para realizar seminários voltados para magistrados federais, estaduais e tribais. O objetivo é familiarizar os juízes com os avanços da neurociência e da psicologia cognitiva. Muitos tópicos já foram levantados, incluindo neuroanatomia, métodos e tecnologia da neurociência; a neurociência da violência; a neurociência da memória; o cérebro adolescente; distúrbios da consciência, com debates sobre coma e estados minimamente conscientes; o cérebro envelhecido e a demência; a neurociência do vício; a neurociência do engano; e outros. Vários juízes participantes declararam a importância do conhecimento adquirido, e um deles escreveu: Em uma decisão importante sobre uma audiência de prisão preventiva de um jovem de 15 anos acusado de assassinato, o desenvolvimento do cérebro juvenil foi uma questão-chave para a prisão preventiva do jovem no tribunal de adultos. (Eu não fiz). (Tradução nossa, Dana Foudantion. 2025). No mesmo sentido, a Royal Society, no Reino Unido, promove programas que reúnem cientistas e membros do judiciário para discutirem áreas de interesse comum e garantir que a melhor orientação científica esteja disponível aos tribunais. No Brasil, já foram promovidos vários cursos com o tema "Neurociências e Tomada de Decisão Judicial", como os da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM) e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Todos os cursos objetivam capacitar magistrados na compreensão do funcionamento do cérebro na tomada de decisão e dos mecanismos por trás das emoções e comportamentos humanos, assegurando que a ciência contemporânea seja corretamente compreendida e aplicada em decisões judiciais. 2. Neurociência e sua Relação com o Direito As neurociências ganharam o centro das atenções na década de 1990, quando foi consagrada pelo governo americano, o então Presidente George H. W. Bush, como a “Década do Cérebro”. Esse período foi marcado por um extraordinário aumento na visibilidade da neurociência e por um grande interesse no estudo do sistema nervoso com o surgimento da técnica fMRI (ressonância magnética funcional), utilizada no mapeamento de funções cerebrais, transformando o entendimento sobre as bases neurais da cognição e do comportamento. Nos anos seguintes, houve uma expansão de pesquisas neurocientíficas, divulgação de artigos, publicação de obras e conferências internacionais, conectando estudiosos de diversas áreas, como juristas, psicólogos e neurocientistas. Do outro lado, nascia a história entre o Direito e a Neurociência. Embora a questão sobre anomalia mental e responsabilidade criminal já fosse antiga, as possibilidades de utilização dos novos conhecimentos sobre os fenômenos da mente poderiam colaborar com o sistema jurídico; fato que resultou numa nova área denominada neurodireito, em inglês: neurolaw. Esse termo apareceu pela primeira vez no artigo do neurocientista americano J. Sherrod Taylor, em 1991, publicado na revista Neuropsychology. O termo Neurodireito propagou-se como novo campo de estudo. O sítio da MacArthur Foundation Research Network on Law and Neuroscience (Universidade Vanderbilt) publicou informações sobre a doação inicial de US$ 10 milhões para financiar o primeiro esforço sistemático de integração do Direito e da Neurociência. Influenciados pelos EUA, nos últimos anos, o Neurodireito tem se firmado como um campo de estudo em diversos países. Acompanhar os avanços da Neurociência e os mecanismos que influenciam o comportamento humano, incorporando esses conhecimentos na interpretação e aplicação das normas, tem sido desafiador para diferentes sistemas jurídicos, sendo incluído no âmbito de estudos do Direito Internacional. Um objetivo central do Neurodireito é fornecer uma base científica para a compreensão do comportamento humano, levando a práticas e políticas jurídicas mais informadas e justas. (CARUSO, 2024, p. 1). Assim, pode-se afirmar que o Neurodireito é uma área de pesquisa interdisciplinar sobre o significado e as implicações da Neurociência para o Direito e para as práticas jurídicas. Ele engloba: o estudo do funcionamento neural do cérebro humano no que se refere às questões de crime, culpa e punição; as aplicações emergentes das tecnologias de imagem dentro dos processos judiciais; o desenvolvimento de métodos mais precisos de detecção de mentiras e de previsão de comportamento criminoso; aprimoramento de meios mais eficazes de reabilitação criminal e a melhoria dos procedimentos de sentença. Novos tempos exigem nova concepção jusfilosófica sobre o Direito. Como ciência, o Direito deve ser sensível aos avanços que a tecnologia e a capacidade cognitiva do homem possam impor para a superação dos novos desafios que se descortinam.(Lima, 2019, p. 42). Em resumo, o Neurodireito, consagrou-se como uma área interdisciplinar que conecta o cérebro ao mundo jurídico, propondo uma percepção mais justa sobre determinados comportamentos humanos. 3. Neurociência e sua Relação com a Seguridade Social no Brasil A Seguridade Social, conforme definida pela Constituição Federal de 1988, artigo 194, constitui um sistema integrado de ações voltadas à saúde, à previdência e à assistência social, visando garantir os direitos sociais e promover o bem-estar da população. Trata-se de um dos pilares do Estado Democrático de Direito estabelecido logo após a ditadura, visando proteger os indivíduos em situações de vulnerabilidade decorrentes da idade, da doença, da incapacidade ou da insuficiência de renda. No Brasil, especificamente, o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), é administrado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), autarquia federal com competência para conceder e manter os benefícios e serviços previdenciários. O INSS, antes denominado Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), foi criado pelo Decreto-Lei n.º 72/1966, com o objetivo de unificar os diversos Institutos de Aposentadorias e Pensões existentes, buscando maior eficácia operacional dos benefícios previdenciários. Atualmente, a Previdência Social é regida por diversas legislações, sendo a Lei 8.213/91, a que define a finalidade e os princípios básicos da Previdência Social. Paralelamente, consta a lei 8.212/1991, que dispõe sobre a organização da Seguridade Social, destinada a assegurar o direito relativo à saúde, à previdência e à assistência social. No entanto, o Estado brasileiro distanciou-se dos princípios constitucionais e princípios dispostos em leis específicas, pois, na prática há diversos problemas de ordem política, administrativa e estrutural que geram graves violações aos direitos dos segurados e das pessoas em estado de vulnerabilidade que necessitam da assistência social. Lamentavelmente, os problemas da Previdência Social no Brasil são históricos, constantemente reformas previdenciárias são introduzidas com várias modificações, sempre com o mesmo argumento de déficit na conta da Previdência Social, responsabilizando os segurados que contribuíram por anos, na expectativa de uma aposentadoria digna. Ocorre que os valores das contribuições sociais e outras receitas arrecadadas pelo Estado, que por lei deveriam ser direcionados para a seguridade social, ao longo dos últimos anos, como é notório, são destinados para finalidades diversas, muitas vezes sem retorno social. Isso contraria o propósito inicial de sustentabilidade da previdência social, afetando a garantia de proteção social e dignidade aos cidadãos beneficiários. 3.1. Princípio da Negação. A Cultura do Indeferimento do Sistema Previdenciário Os princípios norteadores da Previdência Social instituídos com o fim de assegurar aos beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente (artigo 1º da Lei 8.213/1991), são frequentemente esquecidos, dando abertura ao que se pode chamar de “princípio da negação”. Esse princípio não está disposto na legislação, mas ele é sentido pela maioria dos beneficiários. É complexo compreender a falha do Estado em cumprir seus próprios princípios, democraticamente constituídos, ao agravar a desigualdade social, ferir a dignidade humana e obrigar seus cidadãos à judicialização para obtenção de direitos sociais básicos. Essa realidade se revela quando um pedido administrativo de concessão de benefício previdenciário ou assistencial, com todos os requisitos legais preenchidos, é indeferido. Nesse momento, o cérebro ativa seus sistemas de alarme de resposta ao estresse. Há uma total desregulação emocional e a esperança é perdida, vez que o beneficiário tem conhecimento de que um processo judicial no Brasil pode se arrastar por anos; muitos morrem ou têm a doença agravada sem que haja finalização processual. Essa situação é devastadora para a saúde física e mental, pois o cérebro entende que a situação não será resolvida por anos, dando espaço à ansiedade e à profunda angústia. A esperança é consumida pelo tempo, e a incerteza de uma sentença favorável ativa circuitos cerebrais associados ao medo e à antecipação de perdas, aumentando cada vez mais a angústia de não saber se haverá, no amanhã, como prover seu próprio sustento. Em determinadas regiões, especialmente nas abrangidas pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), os processos previdenciários podem levar mais de uma década para serem julgados, ou seja, décadas de insegurança e sofrimento. Além disso, o sistema previdenciário brasileiro vive sob constante instabilidade normativa, com alterações legislativas recorrentes que afetam diretamente a previsibilidade dos direitos. Esse ambiente de incerteza jurídica atinge não somente os segurados, mas também os profissionais da área, comprometendo a previsibilidade do direito e a uniformidade das decisões judiciais. Portanto, cada negação indevida de direitos por parte do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), na maioria das vezes, significa o agravamento da vulnerabilidade de um beneficiário. O Estado, que deveria proteger, torna-se autor de mecanismo que opera de uma maneira "neurodesumana”. No decorrer desses processos administrativo e judicial, aqueles que precisam solicitar Auxílio por Incapacidade Temporária (Auxílio-doença) ou Aposentadoria por Incapacidade Permanente (Aposentadoria por Invalidez), precisam enfrentar outra barreira, por vezes extremamente humilhante: as perícias médicas. A perícia médica previdenciária, tanto a administrativa quanto a judicial, que deveria ser instrumento técnico de proteção com uma profunda avaliação feita por uma equipe médica multidisciplinar, especialistas nas áreas a serem avaliadas, muitas vezes se mostra frágil, marcada por uma breve avaliação, desrespeitosa e com ausência de fundamentos baseados em evidências científicas. Em muitos casos, mesmo quando o segurado possui uma incapacidade permanente para o exercício de qualquer trabalho, essa incapacidade não é reconhecida em desrespeito à Lei 8.213/1991, que determina no seu art. 43, a conversão do auxílio por incapacidade temporária para aposentadoria por incapacidade permanente, a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença. A falta de observação desse dispositivo cria uma repetição de agendamentos e perícias médicas, fato responsável pelo maior número de ajuizamentos de processos previdenciários. 3.2. A Violência nas Perícias Médicas Previdenciárias e os Impactos Neuropsicológicos As perícias médicas são necessárias para avaliar o grau de incapacidade ou grau de deficiência dos beneficiários. A realização da perícia deveria ser um momento de acolhimento do periciado, com atendimento humanizado e análise detalhada dos documentos e exames apresentados pelo examinado. No entanto, frequentemente o que prevalece é a arrogância e a desconfiança do profissional da área da saúde, fazendo com que o periciando se sinta agredido, intimidado, humilhado e obrigado a fazer movimentos que lhe causam dor. A situação é tão grave que foi publicada no Diário Oficial da União (DOU), em 29 de abril de 2025, a Lei n.º 15.126, que insere a “atenção humanizada” como mais um princípio do Sistema Único de Saúde (SUS), alterando a Lei n.º 8.080/1990 (Lei Orgânica da Saúde). Segundo notícia publicada no site oficial do Governo Federal em 29 de abril de 2025, intitulada “Lula sanciona lei que incorpora atenção humanizada ao SUS”: Com a atenção humanizada amplia-se a relação entre o profissional de saúde e o paciente, de modo a proporcionar um atendimento mais acolhedor, com mais empatia e respeito, para tornar a experiência do paciente mais confortável, aumentando a qualidade do cuidado e, com isso, as chances de cura. Diante disso, a inclusão explícita da “atenção humanizada” representa, na prática, uma declaração de que os princípios legalmente consagrados não foram suficientes para assegurar um atendimento respeitoso. E é inegável que a simples inserção de mais um termo na legislação dificilmente será capaz, por si só, de reverter o histórico descaso no tratamento dado às pessoas, por parte das instituições públicas. Essa violência pericial resulta em respostas neurobiológicas, agravando a saúde de quem já se encontra fragilizado. Assim, a ligação entre Neurociência e Seguridade Social no Brasil deve evoluir de modo a proporcionar a inclusão do conhecimento interdisciplinar, guiado pela ciência, pela ética e pelo respeito incondicional à dignidade da pessoa humana. Incorporar critérios neurocientíficos nas perícias médicas que avaliam questões por incapacidade temporária ou permanente de beneficiários e nas avaliações que determinam o grau de deficiência das pessoas com deficiência; capacitar peritos e julgadores para compreender os aspectos técnicos e éticos envolvidos e adotar políticas públicas de acolhimento e celeridade processual. Faz-se necessário para que, verdadeiramente, sejam cumpridos os princípios constitucionais e infraconstitucionais garantidores da dignidade da pessoa humana. A perícia médica deve atentar para as orientações da Organização Mundial de Saúde, do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho da Justiça Federal, todos no sentido de que a perícia médica deve ir além da avaliação das funcionalidades laborais, verificando também as condições pessoais e sociais a fim de constatar se o beneficiário tem efetivas condições de reingresso no mercado de trabalho. Essas observações poderiam reduzir o sofrimento físico e mental daqueles que se encontram em momento de incapacidade laboral. A Neurociência oferece um conjunto de estudos comprovando como a violência disfarçada pode originar o estresse que leva à liberação do hormônio esteroide cortisol do córtex adrenal. Por sua vez, o efeito direto do cortisol danifica o hipocampo, que faz parte do sistema límbico e desempenha um papel importante na memória e no aprendizado, ou seja, esses efeitos do estresse e cortisol causam envelhecimento prematuro do cérebro. É preciso reconhecer que o tema é de suma importância. O sistema político deve assumir responsabilidades que protejam aqueles que buscam pelos seus direitos perante a Seguridade Social, combatendo as agressões de maus-tratos, humilhação, desconfiança e negação infundada. Essas discriminações, mormente com os mais vulneráveis, causam uma série de consequências incompatíveis com a moralidade pública e com a ciência médica em um Estado democrático. 4. Consequências Neurobiológicas da Espera por Decisões Judiciais Para o enfrentamento da questão, o sistema da Seguridade Social e o Poder Judiciário devem observar as pesquisas neurocientíficas, assim o número de beneficiários que, injustamente, são condenados ao adoecimento devido às falhas de agentes públicos, somadas à morosidade processual, seriam reduzidos. Nos tribunais regionais federais do Brasil, frequentemente, há desconfiança quando a doença ou lesão não podem ser percebidas a olho nu. É comum sentenças serem proferidas indeferindo o requerimento do beneficiário com fundamento exclusivo no laudo médico judicial, cuja avaliação foi realizada em poucos minutos, ignorando ou avaliando superficialmente os laudos médicos emitidos por especialistas que acompanharam a progressão patológica ao longo dos anos. Às vezes, as queixas do periciado são diversas, exigindo mais de um especialista, mas isso não importa para o sistema, consequentemente, é gerado um sofrimento emocional grave que pode afetar a estrutura cerebral. Ainda que as neurociências, as tecnologias diagnósticas e perícias médicas envolvendo questões do Direito Penal, capazes de identificar dores, lesões e emoções no cérebro também estejam disponíveis para a área do Direito da Seguridade Social, na prática, o acesso a esses recursos é quase impossível para a maioria dos beneficiários em situação de vulnerabilidade social, considerando a omissão do Poder Público e as poucas publicações enfrentando as injustiças cometidas. Cabe destacar as tecnologias neurocientíficas bastantes usadas para nortear as decisões nos tribunais brasileiros, como: a ressonância magnética funcional, a tomografia computadorizada por emissão de fóton único (SPECT), a tomografia por emissão de pósitrons (PET), entre outras. A ineficiência da Administração Pública em garantir meios de sobrevivência com o mínimo de dignidade para aqueles que dependem do Estado, afronta o princípio constitucional da eficiência da Administração Pública, segundo o art. 37, caput da Constituição Federal. Os procedimentos necessários para nortear decisões judiciais mais justas deveriam ser realizados com a disponibilização das técnicas neurocientíficas, mormente em relação ao sistema cerebral, dentro de um prazo justo, evitando assim o sofrimento emocional. Segundo António Damásio, o cérebro e o corpo encontram-se indissociavelmente integrados por circuitos bioquímicos e neurais recíprocos dirigidos um para o outro. Assim, é indubitável que uma longa batalha judicial por quem espera um benefício previdenciário ou um auxílio assistencial para prover despesas básicas do seu próprio sustento, provoca um desequilíbrio emocional tão profundo que, inevitavelmente, desencadeia o surgimento ou agravamento de patologias. Nessa situação, um dos primeiros sintomas neurobiológicos é a insônia, frequentemente minimizada em sua gravidade, pois não se trata simplesmente de noites mal dormidas, quando o descanso se torna biologicamente interrompido. A insônia é uma perturbação do sono amplamente reconhecida como fator desencadeante de diversos problemas físicos e psicológicos. Contudo, quando provocada por circunstâncias específicas, como a espera prolongada por decisões judiciais, seus efeitos tornam-se ainda mais preocupantes. Estudos recentes, como os apresentados pela American Heart Association, indicam que a privação crônica do sono pode desencadear sérias complicações cardíacas, incluindo hipertensão arterial, arritmias e um risco elevado de doenças cardiovasculares. Psicologicamente, a insônia prolongada promove um aumento significativo do estresse, ansiedade e depressão, afetando profundamente a qualidade de vida e a capacidade funcional. Conforme anunciado pelo National Institute of Neurological Disorders and Stroke (NINDS), a Neurociência explica que o sono é um processo complexo e dinâmico que afeta a forma como você funciona, que o sono insuficiente compromete funções cerebrais fundamentais como a atenção, memória e capacidade decisória, levando à redução da eficácia cotidiana e ao isolamento social. Além disso, os prejuízos à saúde mental e física formam um círculo vicioso: quanto mais tempo dura a espera, maior a ansiedade e menor a qualidade do sono. (National Institute of Neurological Disorders and Stroke, 2025). O estresse crônico, segundo Robert M. Sapolsky, uma das referências mais respeitadas sobre esse tema, é outro fator que se desenvolve, ampliado pela sensação de desamparo, insegurança financeira e preocupação constante com o futuro. Tais sentimentos negativos ativam respostas fisiológicas relacionadas ao estresse crônico, elevando os níveis de cortisol e adrenalina no organismo, comprometendo ainda mais o descanso noturno. Na sua obra ¿Por qué las cebras no tienen úlcera?, Sapolsky apresenta como os seres humanos ativam o estresse crônico em situações de riscos, vejamos: "El modo de concebir las enfermedades que nos afligen ha sufrido una revolución, que consiste en reconocer la interacción entre el cuerpo y la mente, en admitir que las emociones y la personalidad causan un tremendo impacto en el funcionamiento y la salud de la práctica totalidad de las células del cuerpo. Es una revolución que tiene en cuenta el papel del estrés en el grado de vulnerabilidad a la enfermedad, el modo de enfrentarse a los agentes estresantes y el concepto decisivo de que no se puede entender de verdad una enfermedad in vacuo, sino en el contexto de la persona que la padece." (Sapolsky, 2008, p. 16). "Las enfermedades que actualmente nos acosan provocan un daño lento y acumulativo: enfermedades del corazón, cáncer, trastornos cerebrovasculares... Al mismo tiempo que este cambio relativamente reciente en los patrones de enfermedad, se han producido cambios en el modo de percibir el proceso de la enfermedad en sí. Hemos llegado a reconocer el complejísimo entrelazamiento entre la biología y las emociones, las infinitas formas en que la personalidad, los sentimientos y el pensamiento se reflejan e influyen en los hechos del cuerpo. Una de las manifestaciones más interesantes de este reconocimiento es la comprensión de que los trastornos emocionales extremos nos afectan negativamente. En el habla corriente hay una expresión que nos resulta familiar: el estrés causa enfermedades." (Sapolsky,2008, p. 23). "Como resultado, hoy disponemos de una extraordinaria cantidad de información fisiológica, bioquímica y molecular sobre el modo en que todos los elementos intangibles de nuestras vidas —la agitación emocional, las características psicológicas, el tipo de sociedad en la que vivimos y nuestro puesto en ella— influyen en hechos corporales reales, como que el colesterol obstruya los vasos sanguíneos o que no entorpezca la circulación, que nuestras células adiposas dejen de prestar atención a la insulina y nos sumerjan en la diabetes, que las neuronas del cerebro sobrevivan cinco minutos sin oxígeno durante un paro cardíaco." (Sapolsky,2008, p. 24). Conforme acima coletado, é imperativo que o Estado reconheça não apenas os aspectos econômicos, mas também os impactos psicossociais e neurobiológicos que são provocados pela morosidade e insegurança jurídica, face a judicialização de processos previdenciários. Implementar políticas eficazes de comunicação, transparência e agilidade administrativa pode não somente diminuir os efeitos nocivos induzidos, mas sobretudo promover uma significativa melhora na qualidade de vida dos beneficiários. 5. Considerações Finais O principal objetivo foi chamar a atenção do Neurodireito para o campo da Seguridade Social no Brasil. Do mesmo modo que a Neurociência é aplicada no âmbito do Direito Penal e Civil como instrumento para uma sentença ser proferida de forma mais equilibrada, também pode constituir uma nova estrutura para o Direito da Seguridade Social, mormente por essa área envolver questões de direitos humanos universais. A metodologia empregada inclui pesquisas em conteúdos literários e legislações aplicáveis, objetivando estabelecer uma conexão entre o estresse e a longa espera por um processo judicial, quando a demanda envolve questões básicas de sobrevivência com o mínimo de dignidade, ou seja, demandas de natureza alimentar. As emoções negativas causadas por indeferimentos administrativos, sem razão plausível, forçando uma judicialização e imensa insegurança jurídica, foram o principal fator destacado, vez que produzem impactos significativos na saúde mental dos beneficiários. Esses efeitos não são meramente abstratos: manifestam-se no corpo e no psiquismo, com implicações profundas para o bem-estar individual e coletivo. A análise revela o quanto as perícias médicas, muitas vezes superficiais, agravam ainda mais o sofrimento dos cidadãos por meio de práticas desumanizadas, preconceituosas e mecanizadas, em total dissonância com o princípio da dignidade da pessoa humana. Ainda, considera-se a possibilidade de o Estado oferecer formação técnica e ética em neurociência do comportamento para os profissionais da área da saúde. Em suma, esse artigo buscou ressaltar a importância da conexão entre a Neurociência, o Neurodireito, e a Seguridade Social, demonstrando como as emoções mal processadas e prolongadas, despertam gatilhos para o desenvolvimento ou agravamento de patologias, exemplificando a insônia e o estresse. 6. Referências AMERICAN HEART ASSOCIATION. The dangers of sleep deprivation . American Heart Association News, 5 jun. 2020. Disponível em: https://www.heart.org/en/news/2020/06/05/the-dangers-of-sleep-deprivation . Acesso em: 28 mai. 2025. BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: Desvendando o Sistema Nervoso. 4ª ed. Artmed, 2017. CARUSO, Gregg D. Neurolaw. Cambridge: Cambridge University Press, 2024. (Elements in Philosophy of Mind). DOI: 10.1017/9781009271172. DAMÁSIO, António. O erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro humano. 16. reimp. São Paulo: Companhia das Letras, 2025. DAMÁSIO, António. O Mistério da Consciência. 8ª reimp. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. 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- Desafios e Conquistas: A Saga do Empreendedorismo Feminino Através dos Tempos
Uma jornada ao longo dos séculos que revela a força, resiliência e inovação das mulheres empreendedoras. O empreendedorismo feminino tem se destacado como um pilar fundamental para a inovação nos ambientes sociais e econômicos em todo o mundo. Impulsionadas por uma combinação única de talento, determinação e visão progressista, as mulheres conquistam cada vez mais espaço no mundo dos negócios, assumindo papéis de liderança e fundando empresas que prosperam economicamente. Neste contexto, a celebração do Dia Internacional do Empreendedorismo Feminino torna-se um marco relevante. É um momento para refletir sobre as conquistas, avaliar o progresso contínuo e enfrentar os desafios persistentes que ainda impedem realizar um futuro verdadeiramente igualitário e inclusivo no mundo dos negócios. Evolução do Empreendedorismo Feminino: Uma Jornada de Resiliência e Inovação A jornada das mulheres no universo empresarial é um rico mosaico de resiliência, criatividade e inovação, estendendo-se desde os primórdios da história até a contemporaneidade. Essa trajetória destaca a capacidade feminina de superar obstáculos, liderar com sabedoria e impulsionar o crescimento econômico e social em diversas áreas. Personalidades históricas como Hatshepsut, primeira faraó egípcia (Reinado - 1479 a.C. a 1458 a.C.), e a rainha de Sabá (século X a.C.), exemplificam a liderança e a sagacidade administrativa femininas desde a antiguidade. Hatshepsut, destacada entre as figuras mais influentes do mundo antigo, impulsionou o comércio egípcio, enquanto a rainha de Sabá é celebrada por sua perspicácia e habilidade comercial. Narrativas bíblicas ressaltam a participação feminina no empreendedorismo, como o caso de Lídia, mencionada no Novo Testamento (Atos 16:14), que era uma comerciante de púrpura, um tecido precioso e muito valorizado na época. Raquel era pastora (Gênesis 29:9). Seerá, fundou vilarejos (1 Cron. 7:24). Tais escrituras evidenciam que a atividade econômica feminina era vista com respeito. A despeito da dominância masculina na Idade Média, mulheres como Hildegarda de Bingen (1098-1179), e Christine de Pizan (1364-1430), romperam barreiras e se destacaram em áreas como medicina e literatura. Hildegarda era médica, escritora e compositora, enquanto Christine de Pizan foi a primeira escritora profissional da França. No século XVIII, durante a Revolução Industrial e o Iluminismo, o papel feminino na sociedade começou a evoluir significativamente. A industrialização criou novas vagas de emprego nas fábricas, apesar das duras condições de trabalho e salários inferiores aos dos homens. Enfrentando longas jornadas, ambientes prejudiciais à saúde e discriminação, elas ainda assim se destacaram, como Hannah More (1745-1833), por exemplo, utilizou sua posição enquanto educadora e escritora para fundar escolas para meninas de baixa renda, demonstrando um compromisso com a educação feminina. Coco Chanel (1883-1971): Gabrielle Bonheur "Coco" Chanel é um ícone global, cuja influência na moda e no empreendedorismo transcendeu fronteiras. Ela desafiou os papéis tradicionais de gênero e estabeleceu um império no mundo da alta costura. Cora Coralina (1889-1985), Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas foi uma renomada poetisa que retratou a simplicidade da vida interiorana brasileira. Ela também se destaca como um ícone do empreendedorismo feminino, ao iniciar um negócio de doces caseiros, empregando sua habilidade culinária e a criatividade poética como estratégia de marketing. O empreendedorismo feminino ganhou ímpeto no século XX, fomentado por grandes forças: o movimento feminista; a luta por direitos iguais, assegurando às mulheres maior acesso à educação, ao mercado de trabalho e ao crédito; a era digital; e a intensificação do comércio internacional. Esses fatores criaram novas oportunidades de negócios, permitindo que elas liderassem empresas inovadoras e ocupassem espaços antes inacessíveis. No século XXI, observa-se uma expansão acelerada do empreendedorismo feminino, impulsionada pela eclosão tecnológica, pela globalização, pela crescente conscientização acerca da igualdade de gênero e pelo suporte de políticas públicas, incluindo programas de mentoria, incubadoras e financiamento para empreendedoras. Luiza Helena Trajano, uma líder empresarial visionária, transformou o Magazine Luiza em um colosso do varejo brasileiro. Seu trabalho em prol da inclusão social e da igualdade de gênero no ambiente corporativo, serve como um modelo para o empreendedorismo feminino. Em abril de 2025, foi homenageada com o IVI–SK bioscience Park MahnHoon Award por sua liderança no Grupo Mulheres do Brasil e pelo engajamento em campanhas sociais como o movimento Unidos pela Vacina, sendo reconhecida internacionalmente como uma das figuras mais influentes da América Latina. A premiação foi concedida pelo International Vaccine Institute, conforme divulgado no site oficial da instituição em abril de 2025 ( IVI – SK bioscience Park MahnHoon Award ). Cristina Junqueira, cofundadora do Nubank, uma das Fintech mais inovadoras e de maior sucesso da América Latina, quebrou barreiras no setor bancário, tradicionalmente dominado por homens. Com a criação do Nubank, ela não apenas ofereceu uma alternativa inovadora aos bancos convencionais, mas também liderou o caminho para mais inclusão e diversidade na tecnologia financeira. Em 2024, foi eleita pelo Financial Times como uma das 25 mulheres mais influentes do mundo, consolidando sua posição como referência global em liderança feminina e inovação. A inclusão foi publicada pelo Financial Times , com perfil assinado por Luiza Helena Trajano, em dezembro de 2024 ( As 25 mulheres mais influentes do FT em 2024 ). Mulheres empreendedoras, desde líderes do passado até visionárias do presente, constituem uma força global que exemplifica a riqueza e o alcance do empreendedorismo feminino. As narrativas dessas pioneiras, abrangendo diferentes épocas e setores, ressaltam como as sociedades têm evoluído para reconhecer e valorizar o impacto feminino em diversas áreas de atuação. Elas não apenas criam milhões de empregos e estimulam o crescimento econômico, mas também fomentam a inovação e servem de inspiração para outras, ao redor do mundo, seguirem seus sonhos e aspirações. A Relevância do Dia Internacional do Empreendedorismo Feminino Em 19 de novembro, celebra-se o Dia Internacional do Empreendedorismo Feminino, uma efeméride lançada em 2014 na sede das Nações Unidas, em Nova York, por iniciativa da organização Women's Entrepreneurship Day Organization (WEDO) . Essa data é dedicada a homenagear e incentivar a força feminina no universo empresarial, promovendo, simultaneamente, a luta pela equidade de gênero e o empoderamento feminino em todo o mundo. A comemoração do Dia Internacional do Empreendedorismo Feminino constitui uma valiosa oportunidade para refletir sobre os avanços já realizados e sobre as ações ainda necessárias para fomentar um ambiente de negócios genuinamente equitativo e inclusivo. Mais do que uma simples celebração, este dia representa um apelo vigoroso para a eliminação das barreiras que ainda impedem o pleno reconhecimento e suporte às mulheres empreendedoras. Desafios Persistentes na Construção de um Empreendedorismo Feminino Igualitário Apesar dos avanços significativos em políticas públicas e programas de apoio à inclusão feminina no empreendedorismo, a jornada rumo à igualdade de oportunidades ainda enfrenta obstáculos substanciais. Essas barreiras restringem o acesso de mulheres a posições de liderança, perpetuam desigualdades históricas e limitam sua atuação como agentes de transformação nos diversos setores da economia. Um dos desafios mais relevantes é o acesso desigual às redes de contatos, que vão muito além das conexões virtuais e se estabelecem, sobretudo, em ambientes presenciais, espaços onde laços de confiança se formam em interações informais, frequentemente moldadas por dinâmicas culturais predominantemente masculinas. Nesses círculos, as empreendedoras enfrentam obstáculos sutis, porém constantes, que dificultam sua inserção e participação estratégica. Mesmo com qualificações equivalentes às de seus pares masculinos, as mulheres ainda enfrentam discriminação, disparidades salariais e, por vezes, violência de gênero. A sobrecarga da dupla jornada, que impõe responsabilidades profissionais e familiares, contribui para o esgotamento emocional e limita a expansão de seus negócios. Frente a essa realidade, torna-se urgente uma resposta abrangente e eficaz. Políticas públicas com foco em equidade de gênero, programas de mentoria e capacitação, acesso a financiamento adequado e redes de apoio sólidas são fundamentais para a construção de um empreendedorismo inclusivo. Investir na superação desses desafios é investir em um futuro mais justo, próspero e equilibrado para toda a sociedade. Silvâni Silva
- Homologação de Decisão Estrangeira (Sentença Estrangeira) - Guia Completo
Você tem uma decisão judicial estrangeira, como um divórcio, inventário, adoção, cobrança de dívida ou guarda de filhos e precisa que ela tenha validade no Brasil? Para isso, é indispensável passar pelo processo de homologação de decisão estrangeira no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Só com essa homologação é possível garantir efeitos legais no Brasil. Neste guia completo, você entenderá o que é, quando é necessário e como realizar esse procedimento com segurança. O que é a Homologação de Decisão Estrangeira (Sentença Estrangeira) no Brasil? Requisitos para a Homologação de Decisão Estrangeira Casos em que a Homologação de Sentença é Obrigatória Documentos Necessários para a Homologação de Sentença Estrangeira Apostilamento e Legalização de Documentos Questões sobre Divórcio Realizado no Exterior e o Processo de Homologação de Decisão Estrangeira Homologação de Sentenças de Guarda e Alimentos - Revisões Futuras Consequências da não Homologação de uma Decisão Estrangeira Homologação de Decisão Arbitral Estrangeira O que Fazer Após a Homologação da Decisão Estrangeira Homologação de Decisão Estrangeira e Acordos e Tratados Internacionais Considerações Sobre a Homologação de Decisão Estrangeira O que é a Homologação de Decisão Estrangeira (Sentença Estrangeira) no Brasil? Para que decisões judiciais, documentos públicos ou laudos arbitrais emitidos no exterior sejam reconhecidos no Brasil, é necessário que passem por um processo de homologação de decisão estrangeira no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Esse procedimento é a única forma que possibilita atribuir validade jurídica a esses documentos, a fim de que produzam efeitos legais no território nacional. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem competência para processar e julgar originariamente a homologação de sentenças estrangeiras, conforme texto inserido no artigo 105, inciso I, alínea "i" da Constituição Federal, com a devida observância aos ditames dos arts. 15 e 17 do Decreto-Lei n. 4.657/1942 (LINDB), 216-A e seguintes do Regimento Interno do STJ e do Código de Processo Civil (art. 960 e seguintes). O processo possui natureza homologatória, ou seja, não permite discutir o mérito ou a extensão da decisão estrangeira. O STJ exerce um juízo meramente delibatório, verificando os requisitos legais, bem como se houve violação à soberania nacional, à dignidade da pessoa humana e à ordem pública. Requisitos para a Homologação de Decisão Estrangeira Constituem requisitos indispensáveis à homologação da decisão estrangeira (art. 963, CPC): I - ser proferida por autoridade competente; II - ser precedida de citação regular, ainda que verificada a revelia; III - ser eficaz no país em que foi proferida; IV - não ofender a coisa julgada brasileira; V - estar acompanhada de tradução oficial, salvo disposição que a dispense prevista em tratado; VI - não conter manifesta ofensa à ordem pública. Casos em que a Homologação de Sentença é Obrigatória Nem toda decisão judicial estrangeira precisa ser homologada, mas há situações em que ela é obrigatória. Veja os casos seguintes: Divórcio A homologação da sentença de divórcio será obrigatória quando, além da dissolução do matrimônio, envolver disposição sobre guarda de filhos, alimentos e/ou partilha de bens. Essa situação é denominada de divórcio qualificado (art. 464, § 3º, do Provimento n. 149/2023 da Corregedoria Nacional de Justiça). Cobrança de Dívidas Decisões estrangeiras que reconhecem débitos só podem ser executadas no Brasil após a homologação. Testamentos, Inventários e Partilhas de Bens A Justiça brasileira possui competência exclusiva para proceder ao inventário e à partilha dos bens situados no Brasil, independentemente do domicílio ou da nacionalidade do autor da herança. Guarda de Menores e Prestação Alimentícia As decisões judiciais estrangeiras sobre guarda de filho menor, direito de visita e alimentos, devem ser homologadas para que sejam transportadas para o ordenamento pátrio, o direito pleno dos responsáveis legais. Documentos Necessários para a Homologação de Sentença Estrangeira A obtenção da homologação requer a apresentação de documentos específicos. Alguns documentos essenciais que devem ser anexados à petição inicial: Cópia integral da decisão estrangeira; Trânsito em julgado (declaração que ateste a definitividade da decisão); Tradução juramentada; Apostilamento ou legalização consular no país de origem do documento, salvo a existência de tratado que dispense o apostilamento (Convenção da Haia) ou a legalização consular; Documentos de identificação das partes; Procuração pública em favor do advogado contratado. Dependendo da natureza da sentença, outros documentos específicos podem ser solicitados. Apostilamento e Legalização de Documentos Documentos emitidos no exterior devem ser acompanhados de chancela consular ou apostilamento, a saber: Apostilamento (Convenção da Haia) - O apostilamento é o certificado que cumpre os termos estabelecidos na Convenção da Haia, que aboliu a exigência de legalização consular de documentos públicos estrangeiros entre os países signatários. Legalização consular - É o processo de autenticação de documentos no contexto internacional, feito perante um consulado ou embaixada. A legalização é necessária quando o país não aderiu à Convenção da Haia. Dispensa de legalização ou apostilamento Alguns países mantêm tratados que eliminam a formalidade de apostilamento ou chancela consular. Nesses casos, os documentos públicos são aceitos entre os países acordantes independentemente de apostilamento ou chancela consular. Um exemplo é o Decreto 3.598/2000, artigo 23, que facilita a cooperação jurídica entre Brasil e França. Questões sobre Divórcio Realizado no Exterior e o Processo de Homologação de Decisão Estrangeira A homologação de sentença estrangeira de divórcio pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) é necessária nos seguintes casos: Divórcio Litigioso - Quando não há acordo entre os cônjuges sobre a dissolução do matrimônio; Divórcio Consensual Qualificado - Ocorre quando, mesmo havendo consenso entre os cônjuges, o divórcio envolver questões sobre guarda de filhos, pensão alimentícia ou divisão de bens. O Divórcio consensual simples ou puro independe de prévia homologação da sentença estrangeira pelo Superior Tribunal de Justiça e/ ou de prévia manifestação de qualquer outra autoridade judicial brasileira (Provimento nº 149 do CNJ). Homologação de Sentenças de Guarda e Alimentos - Revisões Futuras A homologação de decisão estrangeira não impede o posterior ajuizamento de ação revisional de guarda de menores ou alimentos, que pode ser proposta no Brasil ou no exterior. Em situações de competência concorrente, a primeira decisão que transita em julgado prejudica a outra. Exemplo: se houver uma decisão judicial brasileira e outra no exterior sobre o mesmo fato, a prioridade cronológica é um dos critérios a serem considerados. No entanto, conforme previsto na Convenção da Haia de 2007 (Convenção sobre a Cobrança Internacional de Alimentos) e na Convenção da Haia de 1980 (Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças), todas as medidas concernentes às crianças, o interesse superior da criança será considerado prioritário. Consequências da não Homologação de uma Decisão Estrangeira Não há punições para a falta de homologação de uma decisão estrangeira, mas a falta de homologação impede que ela produza efeitos legais no Brasil, causando diversas complicações, como: Inexecução de obrigações - Dívidas, obrigações contratuais ou determinações judiciais permanecem sem eficácia no Brasil. Isso significa que a parte interessada não poderá executar a decisão estrangeira para obter o cumprimento da obrigação; Estado civil irregular - A falta de homologação de um divórcio impede o reconhecimento da nova situação civil no Brasil. Isso significa que a pessoa ainda será considerada casada no Brasil, o que pode impedir um novo casamento, a alteração de documentos pessoais e gerar problemas em relação à herança e outros direitos; Obstáculos em inventários e transações patrimoniais - Uma sentença estrangeira não homologada que trate de questões sucessórias ou patrimoniais, inviabiliza a realização de inventários, a transferência de bens situados no Brasil, o acesso a contas bancárias e a obtenção de documentos públicos; Insegurança jurídica em relações comerciais - As relações comerciais que envolvam empresas de diferentes países podem ser prejudicadas por ausência de eficácia jurídica das decisões. Homologação de Decisão Arbitral Estrangeira O reconhecimento e a execução de sentenças arbitrais estrangeiras é disciplinado pela Convenção de Nova York (1958), da qual o Brasil é signatário. As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis (art. 1º, Lei nº 9.307/1996). As sentenças arbitrais podem ser proferidas por árbitros nomeados para casos específicos ou por órgãos arbitrais permanentes aos quais as partes se submetem. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) exerce juízo meramente delibatório nas ações de homologação de sentenças arbitrais estrangeiras; não lhe cabe adentrar ao mérito, mas somente verificar se a pretensão atende aos requisitos previstos no Código de Processo Civil (CPC), no Regimento Interno do STJ (RISTJ), na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e na Lei de Arbitragem. O que Fazer Após a Homologação da Decisão Estrangeira Após o trânsito em julgado da decisão estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), será necessário cumprir algumas etapas, como: Registrar e averbar a decisão - Apresentar a carta de sentença homologada ao cartório competente para as devidas anotações; Executar a sentença - Iniciar o processo de execução junto à Justiça, caso seja necessário efetivar obrigações, cobranças ou transferências decorrentes da sentença estrangeira. O cumprimento de decisão estrangeira far-se-á perante o juízo federal competente, a requerimento da parte, conforme as normas estabelecidas para o cumprimento de decisão nacional (art. 965, CPC). Essas providências são essenciais para que a decisão estrangeira produza na prática os efeitos desejados no Brasil, seja para fins pessoais, patrimoniais ou comerciais. Homologação de Decisão Estrangeira e Acordos e Tratados Internacionais Tratados e acordos internacionais são pactos celebrados entre Estados e Organizações Internacionais, regidos pelo Direito Internacional, que abrangem questões das relações internacionais, como: paz, comércio, aplicação de leis e muitas outras questões. O Brasil mantém diversos tratados e acordos internacionais que simplificam a homologação de decisões estrangeiras e fortalecem a cooperação jurídica internacional. Entre os principais instrumentos destacam-se: Convenção da Haia sobre Apostilamento (1961) Simplifica a legalização de documentos públicos entre os países signatários, substituindo a legalização consular pelo apostilamento. A lista de países que aderiram a esse tratado está disponível no Link da HCCH: Status Table - Convenção da Haia Tratados Bilaterais de Cooperação Jurídica O Brasil possui diversos tratados que simplificam a homologação de decisões judiciais estrangeiras. Exemplos: Portugal - O Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta, simplifica a validação de decisões entre os dois países; França - Dispensa a chancela consular ou apostilamento em documentos públicos por força de tratado internacional, Dec. nº 3.598/2000, Capítulo VII, Artigo 23), de acordos de cooperação jurídica em matéria civil; Argentina - Dispensa a legalização em documentos judiciais e públicos tramitados pelas Autoridades Centrais, conforme o Decreto nº 1.560/1995, artigo 23. Esses instrumentos de cooperação internacional simplificam procedimentos técnicos, promovem maior integração jurídica e fortalecem a confiança entre os Estados. Considerações Sobre a Homologação de Decisão Estrangeira A homologação de decisões estrangeiras é um tema de relevância no mundo globalizado. Por meio desse procedimento, assegura-se que sentenças proferidas no exterior sejam reconhecidas e executadas no Brasil, proporcionando segurança jurídica em aspectos pessoais, patrimoniais e comerciais. A correta observância dos requisitos legais, a preparação adequada dos documentos e o conhecimento dos acordos internacionais vigentes contribuem para que o processo de homologação ocorra de modo ágil e eficiente. Com esses cuidados, não só promove a integração jurídica internacional, mas também evita conflitos e incertezas no ordenamento nacional. ========== 📌 Precisa homologar uma decisão estrangeira no Brasil? Fale comigo e tenha apoio jurídico confiável.
- Clara e o Dragão Branquinho
Em uma casinha aconchegante, no fim da rua das Flores, mora Clara, uma menina sapeca de três anos, com cachos cor de mel. Ao seu lado, inseparável como a sombra, está Branquinho, um cachorrinho vira-lata de pelo branquinho, resgatado das ruas. De orelhas empinadas e rabo que não para de abanar, é o companheiro fiel de Clara em todas as suas aventuras, inclusive à noite, enquanto o mundo dorme. Durante o dia, eles exploram cada cantinho do quintal e da casa, inventando brincadeiras e criando histórias fantásticas. Brincam de esconde-esconde entre os móveis da casa, disputam corridas com a bola no quintal e aprontam muitas travessuras. À noite, quando as estrelas brilham no céu, dirigem-se ao quarto para dormir. É aí que ocorre um segredo mágico: Branquinho se transforma em um majestoso dragão de olhos grandes e asas azuis. Clara, curiosa e corajosa, monta em seu cãozinho-dragão, e juntos voam alto, bem alto, rumo a lugares onde criaturas e plantas sabem falar. — Para onde vamos hoje, Branquinho? — Clara pergunta, seus olhos brilhando de felicidade. — Para um lugar onde nunca fomos antes — responde o dragão, com voz de trovão. — À Terra das Formigas Gigantes. Lá, conhecem Dona Palita, uma formiga simpática, que adora longas caminhadas, usando óculos de aro dourado e um chapéu que mais parece um guarda-chuva. — Olá, visitantes! Bem-vindos à Terra das Formigas Gigantes! Sou Dona Palita, a guia deste lugar. Estão prontos para uma boa caminhada? Clara, maravilhada, assente com a cabeça, enquanto Branquinho, agora em forma de dragão, baixa as asas. Guiados por Dona Palita, percorrem caminhos entre árvores gigantes, aprendendo sobre a vida subterrânea das formigas e suas tarefas. — Veja, Clara — Dona Palita aponta para uma fileira de formigas carregando folhas verdes. — Estas são as trabalhadoras. São responsáveis pela colheita e pela alimentação de toda a comunidade. Mais adiante, um grupo de formigas robustas e imponentes chama a atenção de Clara. Dona Palita aponta e diz: — Lá estão os soldados, os guardiões que protegem nossa casa com bravura. — Nossa casa é um lugar cobiçado por muitos, diz Dona Palita. Existem insetos predadores, como as aranhas e os louva-a-deus, que adorariam se banquetear com as nossas larvas e pupas. — Os soldados são maiores e mais fortes do que as formigas trabalhadoras. Têm mandíbulas tão potentes que conseguem morder e cortar seus inimigos — continua a formiga. — Além disso, possuem um ferrão que injeta veneno. É muito doloroso... e pode até matar insetos menores. Branquinho, intrigado com a organização impecável das formigas, pergunta: — Dona Palita, como elas conseguem se comunicar e trabalhar tão bem em equipe? — Ah, Branquinho... as formigas usam feromônios, cheiros especiais que transmitem informações. E têm um senso de comunidade muito forte. É isso que as motiva a trabalhar juntas pelo bem de todos. Depois de uma longa caminhada, chegam ao palácio da rainha das formigas. A majestosa criatura recebe Clara e Branquinho com uma festa animada e montes de doces, afinal, as formigas adoram doçuras! Clara e Branquinho participam da festa, saboreando bolos de mel, pirulitos de orvalho, geleias de pétalas e outras delícias. Antes que a noite terminasse, Clara e o cãozinho dragão se despediram dos amigos da Terra das Formigas Gigantes e voaram de volta para casa, onde ele voltou a ser o pequeno e querido vira-lata. Com uma lambida carinhosa no braço da menina, se aconchegou ao seu lado na cama. Clara sussurrou: — Boa noite, Branquinho. Quando acordarmos, vamos dar açúcar para as formiguinhas do nosso quintal — sussurrou Clara. Ele latiu baixinho, como se dissesse “sim”. Clara então adormeceu, já sonhando com a próxima aventura — quem sabe, um lugar secreto onde morangos vermelhos crescem em nuvens de chantilly. E assim, noite após noite, Clara e Branquinho compartilham segredos que só eles conhecem, numa aventura SEM FIM. Silvâni Silva
- O Natal de Lumin: um Presente Inesquecível
uma jornada inesquecível. Véspera de Natal Era uma noite de Natal, mas o céu brilhava com uma intensidade quase mágica, como se competisse com o sol ao meio-dia! Uhuuu! Uhuu! Lá no Polo Norte, na casa do Papai Noel, o clima era de correria total. Os duendes, pequeninos e engraçados, corriam de um lado para o outro, carregando montanhas de presentes. Cada pacote era embrulhado com o maior cuidado, como se contivesse sonhos. As renas, sempre charmosas, enfeitavam os chifres com laços e bolas coloridas, parecendo querer se transformar em árvores de Natal! E o Papai Noel? Ah, ele estava lá, com sua barriga redondinha, cheia de "ho ho ho", conferindo a lista de presentes pela milésima vez. Não queria esquecer ninguém, nem mesmo as crianças que moravam longe, do outro lado do mundo, onde fazia tanto calor que ele precisaria usar protetor solar! Enquanto isso, na cidade de Nevelândia, a neve caía suavemente, como flocos de algodão, cobrindo as ruas e casas decoradas com luzes que piscavam incessantemente. Papai Noel, em seu trenó mágico puxado pelas renas mais velozes do mundo, sobrevoava a cidade, pronto para sua missão secreta: entregar presentes para todas as crianças que se comportaram durante o ano. O trenó estava abarrotado de pacotes de todas as cores, formatos e tamanhos, cada um com uma etiqueta especial e o nome de uma criança. Entre esses pacotes, um deles era especial: um ursinho de pelúcia chamado Lumin, criado com carinho pelo duende Jinggle. O Brinquedo Fugitivo Naquela noite mágica, enquanto o trenó sobrevoava Nevelândia, uma pequena estrela cadente cruzou o céu e caiu exatamente sobre a caixinha onde o ursinho Lumin estava. Algo extraordinário aconteceu: os olhos de botão do ursinho piscaram, suas patas macias se mexeram e, de repente, ele percebeu... "Estou vivo!" Cheio de curiosidade, Lumin espiou para fora da caixa. O que viu o deixou encantado: o trenó reluzente, os duendes cantando canções de Natal e as renas com sinos dourados. "Que lugar incrível!", pensou ele, maravilhado. Movido pela curiosidade, o pequeno urso resolveu sair da caixa. Ele se inclinou e, com um salto, caiu suavemente nas ruas de Nevelândia, decoradas com luzes coloridas e o delicioso aroma de biscoitos natalinos no ar. Lumin estava deslumbrado e queria explorar tudo. Um Encontro Surpreendente Nas ruas cobertas de neve, duas crianças, Leo e Mila, brincavam jogando neve para o alto quando avistaram o ursinho andando sozinho. — Olha, Mila! Um ursinho de pelúcia que anda! — exclamou Leo, com os olhos arregalados, puxando o ursinho pelas patas. — Deixa eu ver! — disse Mila, já tentando arrancar Lumin das mãos do irmão. Lumin, assustado, tentou escapar, mas as crianças, achando graça da situação, sacudiam o pequeno ursinho de um lado para o outro, rindo e brincando como se fosse um jogo. — Que ursinho engraçado! Será que ele é mágico? — perguntou Mila, jogando-o no chão. Lumin, percebendo que aquelas crianças não eram tão gentis quanto pareciam, fugiu o mais rápido que pôde. Leo e Mila tentaram pegá-lo, mas ele era ágil e se escondeu entre as árvores decoradas para o Natal. A Busca pelo Ursinho Perdido Enquanto isso, no céu, Papai Noel continuava sua missão de entregar presentes, quando percebeu que um dos pacotes estava faltando. — Ora, ora! Estamos com um presente a menos! — exclamou ele, coçando a longa barba branca. Os duendes, que também estavam no trenó, começaram a procurar desesperadamente. — Será que caiu? Será que foi entregue na casa errada? — perguntou um deles, nervoso. Papai Noel sabia que não podia deixar nenhum presente para trás. Nenhuma criança podia ficar sem seu presente de Natal. Ele deu a ordem: — Precisamos encontrar o presente desaparecido! A rena Rudolph, com seu nariz brilhante, olhou atentamente para a cidade abaixo e, com seus olhos afiados, avistou algo: lá estava Lumin, escondido em uma árvore decorada com luzes. O pequeno ursinho estava quietinho, tentando fingir que era apenas mais um brinquedo qualquer. A Menina Céu Papai Noel continuou sua jornada até chegar à casa de uma menina chamada Céu. Do lado de fora, na soleira da janela, ela havia deixado um sapatinho vermelho com um bilhete que dizia: "Querido Papai Noel, eu gostaria muito de ganhar um ursinho de pelúcia." Sorrindo, Papai Noel sabia que tinha o presente perfeito. Ele pegou Lumin com cuidado, colocou-o dentro de uma linda caixa dourada e a deixou ao lado do sapatinho vermelho que Céu havia deixado. Papai Noel sabia que aquele seria um presente especial para ela. Na manhã de Natal, Céu acordou animada e correu para a janela. Quando viu a caixa de presente ao lado do sapatinho, seus olhos brilharam de alegria. Ela rasgou o papel com entusiasmo e, ao abrir a caixa, encontrou o ursinho de pelúcia que sempre sonhou. Lumin, agora fora da caixa, observava a menina de cabelos cacheados, que sorria com tanto entusiasmo que sentiu uma onda de felicidade dentro de si. — Você vai se chamar... — começou a dizer Céu, mas foi interrompida. — Lumin! Meu nome é Lumin — disse o ursinho, mexendo suas patinhas e piscando seus olhinhos. Céu ficou boquiaberta. Um ursinho que falava! Ela o abraçou com tanto carinho que Lumin soube naquele momento que havia encontrado seu verdadeiro lar. Juntos, Céu e Lumin brincaram, riram e compartilharam segredos, tornando-se amigos inseparáveis. A Volta do Papai Noel Enquanto o trenó de Papai Noel cortava os céus iluminados pelas estrelas, ele olhou para trás, observando as luzes das casas diminuírem no horizonte. Sabia que, em cada lar, havia crianças abraçando seus presentes, e que o mais importante não eram os brinquedos, mas a alegria que brilhava em seus corações. Após uma longa e mágica noite, Papai Noel e sua equipe chegaram de volta ao Polo Norte. As renas voaram para as montanhas para descansar, enquanto os duendes, exaustos, mas felizes, relaxavam após um trabalho bem-feito. Papai Noel, sentado em sua grande poltrona, refletiu com um sorriso: — O verdadeiro presente do Natal não está nas caixas enfeitadas com laços. Ele está nos momentos que compartilhamos, nos sorrisos sinceros e na bondade que oferecemos uns aos outros. E assim, com o coração cheio de gratidão, Papai Noel sentiu mais uma vez o espírito do Natal se espalhando pelo mundo, levando alegria e amizade para todos os lares. Ho, ho, ho! FELIZ NATAL!
- Meu Amor Café
Todas as manhãs, sem pedir licença, invades o ar com tua essência densa. Teu perfume abre a casa adormecida, e adoças, sem saberes, a própria vida. Primeiro gole, um susto e um encanto. Na língua, o amargo vira acalanto. Não foste bebida, foste lirismo. Nos anéis da tua fumaça, eu me crismo. Na xícara, teu corpo escuro, eu desejo. No frio me vestes. No cansaço, não bocejo. Cada gole é um rito de calma. Tu em mim, meu verbo é poema. Silvâni Silva.
- Hermafrodita no jardim
O jardim é multicolorido e restrito Roseiras em exuberante harmonia A água prolifera o ciclo perfeito O Sol é o cardeal que alumia. Sempre-vivas de muitas cores Do aroma, ao trabalho cestaria Amarílis, imperatriz de belas flores Quantas espécies és tu, bromélia. Eis que surge um pé de mamoeiro A cura, a sobremesa, o refogado Fruto amarelo mirado pelo doceiro. Flores ou frutos querem os pássaros No jardim, um pé de mamão hermafrodita Verde ou maduro, encantas os tabuleiros.